Moradia na velhice: recomendações para ambientes confortáveis e seguros

Moradia na velhice: recomendações para ambientes confortáveis e seguros

Quando se discutem quais os aspectos que precisam garantir uma moradia confortável e segura na velhice, as primeiras considerações referem-se aos tapetes, que podem causar tropeços e escorregões, às barras de apoio no banheiro, que deveriam existir em qualquer idade, e aos móveis com quinas vivas, igualmente por incorrerem em riscos perigosos. Ambientes efetivamente preparados para o bem-estar de um morador idoso devem prevenir intercorrências ao considerar não somente as quedas, que são preocupantes, mas também a autopercepção de que está abrigado com conforto, a partir dos cuidados com desenho universal, acessibilidade irrestrita e condição de domínio sobre seu território.

O desenho universal permite que ambientes e produtos possam ser utilizados por pessoas em quaisquer condições funcionais, a fim de que mantenham autonomia e independência. Acessibilidade, de acordo com a NBR 9050:2020 (ABNT, 2020), diz respeito à “utilização de maneira autônoma, independente e segura do ambiente, edificações, mobiliário, equipamentos urbanos e elementos à maior quantidade possível de pessoas, independentemente de idade, estatura ou limitação de mobilidade ou percepção”. Quanto ao domínio sobre os espaços de vida, os estudos de Gerontologia Ambiental trazem princípios relacionados aos impactos do ambiente construído sobre o envelhecimento humano, destacando-se os conceitos de agência – capacidade de tomar decisões nas atividades de vida diária – e pertencimento – condição de sentir-se parte de um grupo ou comunidade (WAHL; IWARSSON; OSWALD, 2012).

 

Tais condições sugerem recomendações para que os ambientes domésticos sejam confortáveis, sendo que as dimensões do mobiliário são um modo de garantir segurança nos movimentos necessários às atividades da vida diária.

 

Assentos e camas devem ter alturas que facilitem o movimento de sentar e levantar, e os apoios laterais são importantes para que a autonomia seja preservada. Tanto junto à cama quanto nas laterais da bacia sanitária, é preciso criar condições para que um dispositivo fixo facilite o movimento, evitando apoiar-se em móveis que podem estar instáveis ou em alturas inadequadas. Além disso, gavetas com corrediças telescópicas, aquelas que permitem abertura total, evitam posturas forçadas em balcões de banheiros e cozinhas, principalmente. Do mesmo modo, as alturas dos espaços para eletrodomésticos precisam ser projetadas para facilitar o apoio de recipientes quentes ou pesados, e os armários aéreos podem ser deslizantes, a partir de um mecanismo que desloca suas prateleiras verticalmente para baixo. Em adaptações de mobiliário existente, adotar caixas organizadoras pode permitir melhor utilização de espaços sob a pia da cozinha e do banheiro, garantindo que o alcance visual se amplie.
Pisos antiderrapantes são importantes nas áreas molhadas, mas o destaque na mudança de ambientes é ainda mais significativo, especialmente quando há um pequeno degrau. Isso é possível adotando-se uma soleira com o lado alto chanfrado, em cor diversa aos pisos subsequentes, embora tons muito escuros sejam percebidos como obstáculo por pessoas com baixa acuidade visual. Caso essa peça não exista, há faixas antiderrapantes coloridas que oferecem esse destaque, podendo ainda ser acrescentada uma pequena barra de apoio na lateral da passagem para garantir o sentimento de segurança. Quanto ao uso de tapetes, uma base de borracha com ventosas sob o chuveiro oferece conforto e não desliza, assim como tapetes de material têxtil podem ser utilizados desde que as pontas não estejam no percurso e possam enrolar, arriscando a tropeços. Se forem deslizantes, acrescentar uma base de borracha que os mantêm firmes contra o piso, pois muitas vezes são peças relacionadas com memórias afetivas e não devem ser retiradas, podendo ser realocadas ou se tornarem adornos em paredes, a depender do tamanho.

 

Há ainda as condições de conforto relacionadas com a percepção de luzes, cores, sons e odores, importantes para uma ambiência positiva.

 

Ambiência é o espaço físico, que organiza o ambiente, e espaço estético que o anima, para o exercício das atividades humanas (BESTETTI, 2014). Portanto, o ambiente construído é o cenário de encontro dos sujeitos, onde se produzem subjetividades e são praticados desejos e necessidades. Assim, aproveitar a luz solar sem que haja excessos e desgastes, com pontos de luz artificial que sejam estimulantes ou relaxantes, são decisões que impactam diretamente no estado emocional do usuário. Sua experiência é ainda mais rica se houver cores equacionadas para equilibrar o estado emocional, caracterizado por diferentes temperamentos e personalidades. Acentos visuais são objetos complementares coloridos, mas as superfícies também podem ser pintadas com cores contrastantes ou tom sobre tom, criando uma dinâmica visual igualmente alcançada com estampas coloridas. Sempre evitar desenhos que possam criar desorientação em função de alto contraste ou com formas que sugiram movimento. Sons podem ser ruídos externos, controlados por revestimentos têxteis e esquadrias com vidro duplo, além de músicas escolhidas para agradar os moradores, atualmente utilizando-se assistentes de voz que oferecem também informações importantes e auxílio ao controle de equipamentos. Odores podem ser desagradáveis, originados em banheiros sem ralo sifonado e com pouca ventilação, sendo importante que o projeto evite ventilação que ela leve o mau cheiro para dentro das áreas de permanência prolongada. O “cheirinho de limpeza” pode ser potencializado por produtos químicos, mas é a boa ventilação cruzada que, efetivamente, renova os ares internos.

 

É fundamental compreender, também, que moradia não é só a unidade habitacional particular, mas todo o entorno que faz parte dos percursos de vida e que se estendem até outros bairros, definindo as comunidades onde cada cidadão está inserido.

 

Sendo assim, vale observar quais são as oportunidades de interações sociais positivas para a pessoa idosa nas imediações da sua moradia, desde áreas de cultura e lazer até o comércio local, com calçadas que ofereçam boa condição de caminhabilidade. Esse conceito diz respeito à acessibilidade de quem anda a pé e envolve a adequação do ambiente físico às diferentes condições de funcionalidade de cada indivíduo, considerando pavimentação, dimensões, sinalização, mobiliário urbano e perspectivas ao longo do percurso.

Portanto, apesar de esses conceitos serem importantes em qualquer idade, tornam-se fundamentais na velhice, quando o declínio de capacidades exige mais cuidado sem que a autonomia e o desejo de tomar decisões seja prejudicado. O envelhecimento no local onde haja familiaridade,  Age in Place, é sempre preferível e deve ser considerado por mais tempo possível até quando, se o cuidado intensivo for necessário, a mudança para moradias assistidas for a melhor solução. Afinal, uma moradia digna na velhice é direito de todos, na perspectiva de uma vida saudável e segura.

Referências:

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 9050 – Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Rio de Janeiro: ABNT, 2020.

BESTETTI, M.L.T. Ambiência: espaço físico e comportamento. Revista Brasileira de Geriatria e Gerontologia, v. 17, n. 3, p. 601–610, 2014.

WAHL, H.W.; IWARSSON, S.; OSWALD, F. Aging well and the environment: toward an integrative model and research agenda for the future. Gerontologist, v. 52, n. 3, p. 306-16, 2012.