Embolia pulmonar, uma doença muito comum e que é pouco diagnosticada, deve ser lembrada sempre!
Sr. João Carlos, 75 anos, chegou ao Pronto Socorro com queixa de dor no peito intensa e falta de ar que surgiram de repente. Foi trazido por causa do medo de ser infarto do miocárdio, mas assim que fez o eletrocardiograma ficou aliviado: não era infarto! Mas, afinal de contas, o que poderia causar um quadro tão severo?Ele conta que há cinco dias apresentou uma queda por ter tropeçado na guia da calçada de sua rua. Procurou o mesmo Pronto Socorro onde fez radiografias diversas e, por causa de uma lesão no ligamento do joelho direito, foi medicado com analgésicos, orientado a fazer repouso e iniciar fisioterapia. Ora, como apesar dos analgésicos o joelho permanecia doendo muito ao dobrar, ele optou por colocar um imobilizador e permanecer o mais quieto possível até iniciar a fisioterapia dali a duas semanas… Os médicos suspeitaram de embolia pulmonar. A família do Sr. João Carlos já havia ouvido falar disso, mas ficou cheia de dúvidas: afinal, isso é grave?
Quando pensamos em sintomas como dor no peito ou falta de ar naturalmente associamos a doenças do coração, porque são frequentes e potencialmente graves. Mas existem outras patologias que são pouco diagnosticadas e têm uma importância muito grande como origem de sequelas ou causa de morte. Certamente entre elas está o tromboembolismo pulmonar, mais conhecido como embolia de pulmão.
Como acontece a embolia de pulmão?
Para entender esta pergunta, precisamos lembrar que o sangue venoso volta ao coração e é bombeado aos pulmões para que seja novamente oxigenado. As veias das pernas e da pelve podem desenvolver coágulos em determinadas situações, que vão se deslocar de sua origem e, passando pelo lado direito do coração, serão encaminhados aos pulmões, entupindo artérias que o irrigam. Neste momento existe sofrimento do órgão, gerando dor, e piora de seu funcionamento, acarretando falta de ar. Vide a figura abaixo:
As situações que facilitam o desenvolvimento de coágulos nas veias incluem aquelas em que a velocidade de fluxo sanguíneo está diminuída, a viscosidade do sangue está mais alta ou quando por algum motivo existe uma tendência maior a se criarem coágulos, chamados de estados de hipercoagulabilidade.
Exemplos de tais situações são a imobilização, principalmente de membros inferiores, a desidratação ou doenças que determinam maior facilidade de produzir coágulos, como no câncer ou alterações genéticas familiares. Segue abaixo uma lista de situações predisponentes:
- imobilização secundária a trauma ou cirurgia de membros inferiores;
- voos com duração maior que 6 horas;
- desidratação;
- algumas doenças do sangue em que haja aumento da quantidade de glóbulos vermelhos;
- doenças pulmonares;
- insuficiência cardíaca;
- terapia de reposição hormonal ou uso de anticoncepcionais orais;
- neoplasias (câncer);
- doenças genéticas e familiares que predisponham essa condição.
Toda embolia de pulmão se apresenta da mesma forma?
Como se costuma dizer no meio médico, só é possível fazer o diagnóstico de embolia pulmonar se esta possibilidade for lembrada, porque as manifestações da doença são inespecíficas (podem ocorrer em diversas outras doenças), os sinais clínicos são pouco marcantes e os exames mais corriqueiros, presentes na maior parte dos serviços médicos, pouco ajudam. Para se ter ideia, esta ainda é uma causa frequente de óbitos que só são esclarecidos em autopsias. Os sinais clínicos mais frequentes relacionados à embolia pulmonar são:
- Dor torácica;
- Falta de ar;
- Tonturas e perda de consciência;
- Palpitações;
- Tosse;
- Febre;
- Fadiga;
Para fazer o diagnóstico, o emprego de exames complementares, tanto laboratoriais como de imagem, aumentam muito a assertividade. Alguns exames são de importância especial como o Dímero D, exame de sangue que mostra presença de coágulos dentro da circulação e se apresenta aumentado na embolia pulmonar. O resultado normal deste exame potencialmente exclui a possibilidade da doença. Outra investigação importante de ser checada é a troponina, enzima do coração que pode aumentar em embolias maiores e está relacionada ao prognóstico da doença. Quando alterada, podemos imaginar que a embolia é mais extensa. Pode causar confusão com o infarto do miocárdio, que é a outra condição mais frequente de elevação deste marcador.
Exames de imagem mais comuns, como eletrocardiograma ou radiografia de tórax devem ser realizados, mas na maioria das vezes não trazem alterações que sejam clássicas de embolia pulmonar. São importantes para afastar outras causas como infarto, pneumonia entre outras causas de dor torácica.
O melhor exame para o diagnóstico adequado é a tomografia de tórax com contraste. Através das imagens obtidas, é possível encontrar os locais onde houve a obstrução dos vasos pelos coágulos (chamados de êmbolos) que vieram das veias calibrosas das pernas ou da pelve.
Embolia pulmonar tem tratamento?
Sim, sem dúvida! O tratamento da embolia pulmonar deve ser iniciado assim que é feito o diagnóstico e vai depender da gravidade do quadro que o paciente apresenta. Para aqueles que têm repercussão importante como perda de consciência, queda importante da oxigenação ou redução significativa da pressão arterial, sinais que sugerem maior comprometimento, a tentativa de retirada das obstruções através de medicamentos que dissolvem os coágulos ou de procedimento de retirada dos mesmos através de um tipo de cateterismo se impõe. Mas na maioria dos casos a instituição de medicamentos anticoagulantes será suficiente, e visa reduzir o risco de extensão desses coágulos obstrutivos e da possibilidade de novos êmbolos chegarem aos pulmões. O tratamento com anticoagulantes costuma se estender por meses e eventualmente pode ser necessária sua manutenção para o resto da vida.
Existem meios de se evitar a embolia pulmonar?
Quando pensamos que a formação de coágulos tem fatores que facilitam seu aparecimento, sabemos que se os evitarmos nós teremos menos chance de desenvolver a doença. Manter hidratação adequada, usar meias elásticas, que diminuem a quantidade de sangue “estagnado” nas veias das pernas, e movimentar-se, são exemplos de atitudes simples que terão impacto. O conselho vale principalmente para pessoas que estejam sob risco, como aquelas estejam se recuperando de cirurgias ortopédicas, pacientes com algum tipo de câncer, doença pulmonar ou insuficiência cardíaca. Em alguns casos, medicamentos anticoagulantes – que “afinam o sangue” – podem ser indicados. Seu médico saberá orientar o melhor meio de prevenção. Quando não é possível o uso de anticoagulantes, pode-se considerar o implante de filtros nas veias, que funcionam como um “guarda-chuva” e não permitem que os êmbolos cheguem aos pulmões.
E o Sr. João Carlos, como ficou?
A equipe do PS rapidamente colheu exames e encaminhou o paciente para fazer a tomografia de tórax com contraste. Lá confirmaram o diagnóstico, compatível com os achados dos exames de sangue, que mostraram Dímero D aumentado, mas troponina normal. Passou a receber anticoagulantes, tratamento de suporte com oxigênio e fisioterapia e foi de alta em cinco dias após ter melhorado, usando medicações anticoagulantes orais. Se não tivesse feito o diagnóstico correto, certamente o quadro poderia ter se agravado e o levado a risco de ficar com alguma sequela (como falta de ar crônica, arritmia ou insuficiência cardíaca) ou mesmo risco de morrer.
Então, não deixe de avaliar os sintomas torácicos que surjam de repente, principalmente se houver algum fator que facilite formação de coágulos. O médico saberá como investigar!
Sobre o autor:
Cardiologista e Emergencista do Corpo Clínico do Hospital Sírio-Libanês.
Pós - graduado em Geriatria pelo IEP – Hospital Sírio-Libanês. Gestor do Pronto Atendimento no Hospital Santa Cruz (2004 a 2009). Membro do comitê de ética do Hospital Sírio-Libanês (desde 2014).
Responsável técnico pela Clínica Barduco há 25 anos. Membro do Conselho Editorial da TREVOO (desde 2021).