Não é raro que algumas condições de saúde comuns na população idosa, sejam encaradas como dissabores da velhice. Uma delas é a incontinência urinária.

Podem acontecer em casos de demência como em um jogo de sombras. A família e o paciente se esquivam de revelar a imagem real da situação, talvez por preferirem atribuir as evidentes alterações cognitivas à idade avançada ou a um grau de dependência funcional desproporcional ao estado clínico.

Ao perguntarmos o motivo da necessidade de auxílio, a resposta é um singelo:

– Mas também, nessa idade, o senhor queria que ele fosse capaz de tudo?!

Infelizmente muitos profissionais de saúde evitam um assunto “desconfortável” e não querem abordar perdendo oportunidades de diagnóstico e tratamento.

Incontinência Urinária: uma “Síndrome geriátrica’

A perda involuntária de urina é um exemplo dessas condições que chamamos de síndrome geriátrica. A incontinência urinária frequentemente não é relatada pelo paciente, seja por constrangimento, desesperança em obter alívio ou simples resignação.

É uma condição bastante comum (acomete cerca de um terço dos idosos). Pessoas acamadas, internados em hospitais ou instituições de longa permanência apresentam índices mais altos.

Mulheres sofrem mais que homens, já que têm a uretra mais curta, facilitando perdas associadas a esforços (como tossir, agachar-se, espirrar, etc… mesmo as mais jovens.

Nos homens a obstrução da via urinária pelo aumento da próstata, fato comum com o avançar da idade, pode resultar em incontinência.

Em ambos os sexos o envelhecimento é, de fato, um grande fator de risco para a incontinência urinária: a incidência aumenta de modo diretamente proporcional à idade.

A intensidade dos sintomas (o quanto a incontinência perturba seu portador) aumenta com o envelhecimento. A menor capacidade da bexiga em armazenar a urina sem disparar o desejo da micção pode levar a um desejo intenso e incontrolável de urinar – a urgeincontinência.

Mecanismos causadores

  • Redução da capacidade de contração do esfíncter da uretra
  • Menor capacidade de armazenamento da bexiga
  • Disparos involuntários da musculatura da bexiga
  • Obstrução por crescimento prostático – incontinência por transbordamento
  • Doenças da bexiga – cálculos, tumores, infecção urinária
  • Perda funcional e cognitiva – dificuldade de locomoção, pessoas acamadas, depressão
  • Uso de medicamentos – diuréticos, alguns antidiabéticos, entre outros
  • Constipação intestinal

Consequências indesejáveis

Embora tão frequentemente negligenciada, a incontinência urinária traz consequências bastante indesejáveis, como queda na autoestima, constrangimento e retração social até complicações mais objetivas, como infecções, lesões de pele e maior risco de quedas.

A incontinência urinária representa uma das principais causas de institucionalização de idosos e uma das principais fontes de gastos com sua saúde, dada sua alta prevalência e repercussões.

O melhor caminho

Uma vez reconhecida a incontinência o primeiro passo para melhorar a situação é o diagnóstico correto. A avaliação completa dos fatores listados acima é fundamental.

Estabelecido o diagnóstico, o próximo passo é a correção de fatores reversíveis. Medicamentos de uso frequente podem interferir com a micção, por exemplo.

Tratamentos não farmacológicos são de grande valor para a maioria dos casos. Controlar a ingestão excessiva de líquidos evitar o uso de estimulantes da contração da bexiga, como álcool, chá e café, facilitar o acesso à toalete e estabelecer horários para as micções são de grande valor.

O chamado diário miccional deve registrar a cada hora de tudo o que é ingerido, as micções, o volume urinado, e os episódios de perdas por três dias consecutivos. Pode ser útil para a definição de estratégias de micção programada, para pacientes mais dependentes, ou reeducação da bexiga, para os mais cooperativos.

Diversas técnicas de fisioterapia para treinamento da musculatura do assoalho pélvico, têm grande valor no controle do quadro. A fisioterapia urológica pode ser realizada com ou sem aparelhos e instrumentos e será assunto de outra publicação

Ainda existe o tratamento cirúrgico para casos selecionados. As técnicas pouco ou minimamente invasivas são as preferidas para a população idosa. Também podemos contar com medicamentos específicos capazes de amenizar em grande medida o problema.

A incontinência urinária é um transtorno comum em idosos, mas frequentemente não relatado pelos pacientes e nem investigado por profissionais.

O estigma associado a essa questão compromete diversas oportunidades de tratamento. Uma abordagem direta e honesta, tanto da parte do profissional quanto daquele que vive o problema é a melhor opção para o sucesso da qualidade de vida do paciente e seus familiares.

Sobre o autor:

Jose Renato Amaral
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José Renato Amaral, clínico e geriatra, médico do Hospital das Clínicas da FMUSP, do Hospital Nipo Brasileiro e do Hospital Sírio Libanês. Graduação em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Residência Médica em Clínica Médica pela FMUSP. Residência Médica em Geriatria e Gerontologia pela FMUSP. Especialista em Clínica Médica pela Sociedade Brasileira de Clínica Médica. Especialista em Geriatria pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. Médico assistente do Serviço de Geriatria do Hospital das Clínicas da FMUSP. Médico do corpo Clínico do Hospital Sírio Libanês (Núcleo Avançado de Geriatria). Coordenador dos cursos teóricos de extensão universitária em Geriatria da Disciplina de Geriatria da FMUSP.

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