Cada vez mais a sexualidade de pessoas idosas tem ganhado a atenção do público e do campo do saber gerontológico, ao mesmo tempo em que há um aumento no número de pessoas com demência, como a causada pela Doença de Alzheimer.

Ao contrário do que muitos acreditam, algumas pessoas com demência podem manter desejos e expressões de sexualidade.

É inegável que muitos apresentam uma redução no desejo, na frequência e na satisfação sexual, mas pesquisas realizadas nas últimas décadas mostram que a intimidade, o toque, a privacidade, a sensação de vínculo com alguém e, em alguns casos, até mesmo o ato sexual, podem ser benéficos tanto para a pessoa com demência quanto para sua parceria.

Existe a possibilidade de acontecer com um casal, por exemplo, em que uma pessoa tenha demência, ou as duas tenham ou, até mesmo, aconteçam novas relações em Instituições de Longa Permanência para Idosos. Isso pode acender um debate no qual não existe verdade absoluta ou respostas fáceis e prontas.

Entretanto, não é raro que uma pessoa com síndrome demencial que expresse ou tente manifestar sua sexualidade seja considerada inapropriada por nós, ou seja caracterizada como alguém agitada ou agressiva, e por isso, receba uma intervenção medicamentosa sem necessidade.

Com esses conhecimentos em mente, profissionais da saúde também devem avaliar a capacidade de consentimento dessas pessoas lembrando, por um lado, que a despeito da evolução do quadro cognitivo, muitos podem manter a capacidade de tomada de decisões, a qual se deteriora com a evolução natural da doença.

Por outro lado, no tocante à proteção de pessoas com demência é importante destacar que  o “estupro de vulnerável” é previsto no código penal como um crime e parceiros fixos podem ser, em tese, enquadrados nessa legislação.

Nesse contexto, reprimir ou proibir a expressão da sexualidade de pessoas idosas, sem embasamento, pode ser um ato violento que contribua com o sofrimento biopsicossocial da pessoa com demência e de seus familiares.

 

Sexualidade não se resume ao ato sexual

Além disso, sexualidade não se resume apenas ao ato sexual, e nossa abordagem não pode ser baseada no binarismo do “Tudo ou Nada”, do “Certo ou Errado” ou do “Normal ou Patológico”. É preciso ir além, respeitando a biografia e heterogeneidade de cada um.

Mesmo nos casos de evolução da demência e perda da capacidade de consentimento, é possível orientar as pessoas que se relacionarão sobre as diferentes formas de carinho, de afeto, de toque e de intimidade como abraços ou até mesmo uma massagem nos braços e nas pernas com aroma agradável.

Por fim, como sexo e sexualidade muitas vezes são considerados assuntos “tabu” pela sociedade, as percepções individuais têm grande impacto na vivência e no tratamento que desempenhamos. Uma pesquisa com cuidadores de idosos mostrou que aqueles que se sentiam desconfortáveis com esse assunto teriam uma tendência maior a reprimir ou silenciar qualquer manifestação sexual da pessoa idosa. Dessa forma, nada melhor do que falar sobre isso e planejar estratégias de comunicação para um assunto tão importante.

Sobre o autor:

Dr. Milton Crenitte
+ artigos

Médico Geriatra do Ambulatório de Sexualidade da Pessoa Idosa – Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Professor do curso de medicina da Universidade de São Caetano do Sul, voluntário da ONG Eternamente SOU.

Copy link
Powered by Social Snap