Dra. Débora atendia Sr. João há 16 anos.  Ele não era o paciente mais exemplar do mundo no que se refere a auto cuidados em saúde bucal. Fora vítima de uma época em que a Odontologia  Preventiva não tinha espaço. Profissionais e pacientes estavam acostumados com extrações dentárias e não tratamentos.

Sr. João, aos seus 48 anos, já usava com uma dentadura superior, comia muitos doces e tinha 14 dentes inferiores restaurados. Ao completar 55 anos começou a se tratar com Dra. Débora e entendeu a importância do autocuidado em saúde bucal. Ela era muito dedicada e sempre explicava como escovar e limpar a dentadura.

Dedicada aos seus pacientes, durante os três primeiros anos de atendimento, semestralmente, Dra. Débora chamava Sr. João ao consultório para um check up. O procedimento era sempre o mesmo: fazia uma bela profilaxia, removia cálculo (tártaro) e elogiava: “parabéns, sem nenhuma cárie ou inflamação, pode voltar daqui a um ano.”

E assim se foram mais 5 anos…

Porém, sr. João, já aos 63 anos, e Débora o acompanhando há oito, ouve um discurso diferente, no retorno ao consultório “- Sr. João, é precisa escovar melhor os dentes, devido ao sangramento gengival, e há dentes moles, o que é novo em nossas consultas. Já perdeu tantos dentes por não escová-los, logo o senhor que sempre foi tão cuidadoso!”

 

A importância do olhar atento dos dentistas sobre a relação bidirecional entre saúde bucal e doenças no corpo

Sr. João tinha um grande apreço por Débora e não insistiu que estava se cuidando. Conforme solicitado, voltou quinzenalmente e a inflamação não diminuía. Porém, o que Débora nem suspeitava é que, somado ao quadro bucal e à história de grande consumo de doces, o Sr. João estava apresentando alguns sintomas novos: perda de peso, tomava muita água, ía muitas vezes ao banheiro à noite e estava com a visão embaçada, o que já não lhe permitia uma boa higiene bucal. Realmente aparentando ser um caso de saúde bucal e doenças no corpo.

Este foi o start para Débora, que dedicara seus 8 anos de formada à ser uma dentista técnica, acreditando que seus pacientes só tinham boca, começar a pensar diferente

Sr João estava com diabetes, portanto, não era má escovação. A descoberta veio por Cora, uma colega dentista que examinou o Sr. João, colheu sua história e pediu exames laboratoriais para descobrir se a condição bucal nova tinha só causas locais. Os resultados mostraram alteração nos exames do metabolismo do açúcar.

Cora explicou para Débora que, muitas vezes, o dentista é o profissional da área da saúde que está mais próximo do paciente e pode ser muito importante na hora de encaminhá-lo para o médico. Neste caso, conduziu o diagnóstico e o início do tratamento de diabetes.

A partir daí começou uma nova carreira para Débora. Ela estudou, fez cursos para entender as complicações bucais que tem relação com doenças gerais e vice-versa. Viu que todos seus pacientes tinham bocas e corpos associados. Não parou mais! Se apaixonou pela pesquisa e hoje é professora nesta área!

Um segredo… João é uma das pessoas mais importantes da vida de Débora. É seu avô!

Sobre o autor:

Dra. Monira Samaan Kallás
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Dentista no Consultório, em Home Care e hospitalar. Doutora em Ciências da Saúde pelo Instituto de Ensino e Pesquisa do hospital Sírio-Libanês. Especialista, mestre em Odontologia e Saúde Coletiva pela Faculdade de Odontologia da USP. Habilitada na área hospitalar pelo Conselho Federal de Odontologia e Colunista do Portal Trevoo.

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