Abordagem das principais disfunções sexuais femininas
Então, doutora, quando o sexo vai bem, nem falamos sobre isso. Quando não vai bem, falamos menos ainda!
É um erro pensarmos que é possível fingir que está tudo bem, que podemos levar o desconforto, às vezes a dor, a culpa, a ausência de desejo, de prazer, indefinidamente sem repercussões para nossa saúde física e mental. A identificação e a nomeação do que ocorre é o primeiro passo. “Não tenho desejo” ou “sinto dor” já norteiam a investigação. Se existe uma parceria envolvida, toque no assunto, de preferência num local neutro, com tempo e privacidade para conversar. Digo para minhas pacientes que não se discute a relação onde se TEM a relação ou no momento que esse encontro não aconteceu e gerou mágoa, raiva, frustração. Busque o diálogo. Recebo muitas pacientes angustiadas, receosas de abordar o tema sobre as disfunções sexuais femininas. Procure falar de forma clara, direta, para não haver necessidade de interpretação ou adivinhação.
“Nossa, doutora, será que ele não percebe que eu estou distante, ou que eu não estou gostando?”
Não! Muitas vezes seu parceiro não percebe mesmo, você precisa falar.
“E se ele achar que não gosto mais dele, que tenho outra pessoa em minha vida?”
Para evitar qualquer mal entendido, assertividade é fundamental.
Estima-se que entre 20 e 50 % das mulheres americanas apresentam alguma disfunção sexual ao longo da vida. No Brasil, o Estudo da Vida Sexual do Brasileiro, conduzido pela Dra Carmita Abdo, mostrou 28,5% das mulheres com alguma queixa relacionada à vivência da sexualidade.
E o que pode ser feito para tratar uma disfunção sexual? Quem trata?
O sucesso do tratamento depende de se fazer o diagnóstico da melhor forma possível. O ideal é o atendimento ser realizado por uma equipe multiprofissional, já que as disfunções sexuais femininas tendem a ser multifatoriais.
Na maioria das vezes, o ginecologista é quem primeiro a paciente procura. Muito importante o profissional acolher a queixa, ouvir sem julgamentos, explicitar os sintomas. Há quanto tempo isso ocorre? Em que situações? Como você se sente a esse respeito? Procuramos identificar quais fases da resposta sexual estão afetadas para efeito de direcionamento do raciocínio. Assim, podemos tentar enquadrar a queixa como disfunção do desejo, da excitação, do orgasmo ou dor .
O médico muitas vezes irá diagnosticar e tratar as alterações físicas presentes. Por exemplo, processos infecciosos ou inflamatórios na vagina se traduzem em dor e dificuldade à penetração e podem ser resolvidos de forma relativamente simples. Cremes vaginais, tratamento da atrofia genital com hormônios ou laser ou reabilitação do assoalho pélvico podem garantir a saúde sexual da paciente. A fisioterapia é de grande ajuda principalmente nos casos em que a tensão da musculatura do períneo prejudica a atividade sexual.
Exames laboratoriais e de imagem também são importantes para descartar situações específicas, como mau funcionamento da tireoide ou falta dos hormônios sexuais, como acontece na menopausa. Alguns medicamentos, como anticoncepcionais e drogas de ação central podem interferir principalmente no desejo e sua substituição pode ser interessante.
Muitas vezes não encontramos uma causa física para justificar a queixa e a avaliação por um psicólogo ou psiquiatra é necessária.
Existem vários recursos em terapia que podem ser usados dependendo do caso e, principalmente, da experiência do terapeuta. A terapia pode ser individual, em casal ou em grupo, dependendo da situação. Em especial a terapia cognitiva comportamental tem resultados muito bons, inclusive para o vaginismo e disfunção orgásmica, ajudando a “reprogramação” da resposta sexual. Melhorar o conhecimento sobre seu corpo e perceber como e onde você gosta de ser tocada é um bom início.
A masturbação, seja sozinha ou com sua parceria, é um exercício importante para esse autoconhecimento. Algumas técnicas de relaxamento e de manutenção do foco, como no Mindfullness, também são interessantes.
Pensar em sexo, fantasiar mais, aumentar o seu repertório através de leituras e filmes também é parte desse processo. Avalie como vocês têm esse encontro sexual. Será que o estímulo é adequado? E a frequência desses encontros? O local, o tempo, a disponibilidade, a intimidade. O que eu PODERIA mudar? O que eu GOSTARIA de mudar?
Alguns medicamentos podem ajudar no desejo e na excitação, como o Tribulus terrestris, que é um fitoterápico, a bupropiona, que é um antidepressivo, a tibolona e os próprios hormônios masculinos.
Se você estiver na menopausa, converse com seu médico sobre reposição hormonal baseada em estradiol e progesterona. A reposição de testosterona ainda não é consenso e, quando realizada, deve ser acompanhada atentamente e por períodos limitados.
Este assunto é amplo e não se esgota em alguns artigos. Espero ter contribuído! Pensar as próprias experiências, perceber como a vivência da sexualidade impacta sua qualidade de vida e, sempre que necessário, não ter preconceito e procurar ajuda.
No nosso próximo encontro, vou abordar o tratamento das disfunções sexuais masculinas. Eles também precisam de cuidados!
Sobre o autor:
Luciene Miranda Barduco, médica formada pela USP, continua apaixonada por sua especialidade, a ginecologia e obstetrícia. Depois descobriu a mastologia e, recentemente, a sexologia. Médica, esposa, mãe da Mariana e gosta muito de tudo isso! Colunista do Portal Trevoo.
@lulubarduco